Cheguei em casa.
Gato estava na janela.
Pra variar.
Chegava a dormir, de sonhar.
Roncava, babava.
Até se espreguiçava.
Não sei como não caía.
Incrível este cachorro.
Fez a maior festa, parecia que eu havia sumido por séculos.
Peguei um dinheiro, a coleira dele e abri a porta.
Praticamente, quem apertou o botão pra chamar o elevador foi ele, tantos e tão altos eram os pulos que dava.
Realmente, o animalzinho estava felicíssimo por me ver.
Ou, talvez, fosse a perspectiva de tomar uma gelada.
Cachorro esperto, este.
Esperto e bebum.
Dizem que os cães são iguais aos donos, ou o contrário.
E que, na verdade, eles é que são nossos donos, e não nós deles.
Psicologia canina.
E tem cara que se forma numa faculdade só para ficar fazendo este tipo de pesquisa e montando estas teses e teorias.
E ainda ganham prêmios, fama e dinheiro.
E eu aqui, desempregado.
Sinistro.
Mundo estranho.
Cheguei ao Portuga e, inacreditavelmente, ele não estava sozinho.
Tinha uma galera lá, bebendo, rindo, comendo uns petiscos.
Aliás, petiscos, não.
O Portuga tinha colocado uma churrasqueira, daquelas pequenas, com tampa, na calçada, e estava assando qualquer coisa.
Pelo visto, cansou de abrir o bar para as moscas.
O que era eu não sei, mas o cheiro estava ótimo.
Gato também percebeu.
O rabo parecia uma hélice, tanto que girava.
Fiquei imaginando ele chegando no balcão, voando, com o rabo funcionando como uma hélice de helicóptero.
O corpo inclinado para baixo, as patas balançando no ar, a língua de fora.
Acho que o Portuga nem iria ficar muito espantado, se isso acontecesse.
Ele já era fã incondicional de Gato.
Punha a maior fé no bichinho.
Ao nos ver, abriu um sorriso maior que o rosto.
Gato saltou, agilmente, para a primeira banqueta livre, na ponta do balcão.
Aliás, a única.
O Portuga tocou um dos clientes, dizendo que eu era da família.
Que eu tinha cadeira cativa.
Eu e Gato.
Que moral.
Nem precisamos falar nada, ele já foi buscar uma cerva, geladaça.
E meu copão e a vasilha de Gato.
Os demais clientes demoraram a perceber o que se passava, e não acreditaram quando viram Gato beber a vasilha inteira de uma só vez.
E sentado na banqueta, como se gente fosse.
O bicho estava com mais sede que eu.
Ou era crise de abstinência.
Lambeu tudo e ficou olhando pro Portuga, com aquela cara de “quero mais”.
O gajo não se fez de rogado, já foi logo servindo outra.
Avisei:
- Vai com calma aí, Portuga.
- Tás com ciúmes, é?
- Talvez sim, talvez não.
- Sei, boto fé.
E soltou uma sonora gargalhada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário